Lembro-me de, bem pequena, passar a noite quase em claro à espera do primeiro raio de claridade que anunciava aquele dia mágico.
Logo ao alvorecer voava direita à chaminé e deliciava-me a desvendar os mistérios escondidos atrás dos papéis e laços coloridos, mesmo até quando alguns já tinham sido deslindados em espreitadelas furtivas pela porta entreaberta de um armário quase sempre bem fechado.
"Ohs! e "Ahs!", risos alegres e olhos brilhantes em rostos suaves eram contemplados pelos mais velhos, que denunciavam a sua emoção embevecida nas pequenas lágrimas que teimosamente insistiam em humedecer-lhes os olhos.
Não havia árvore de natal nem enfeites brilhantes, apenas a humildade de um pequeno presépio iluminado pelas luzes trémulas de pequenas velas, mas aquela atmosfera transpirava amor e afecto.
Nunca importava realmente o que era descoberto dentro dos embrulhos vistosos, o que me fazia sentir bem era aquela ambiência de "Lar" que me envolvia docemente num apertado abraço e que guardarei para sempre no meu coração.
Durante muito tempo tudo prosseguiu igual e tradição e significado permaneceram bem acesos, mesmo em tempos difíceis que se viveram.
Anos depois tudo se desmoronou quando estes dias, em vez de mais unirem pessoas, almas e corações, obrigavam a escolhas difíceis, opções de sentimentos e, numa encruzilhada onde nunca era fácil saber qual o rumo a seguir, alguém sempre se tinha de deixar para trás e se seguia dividido e incompleto.
Nunca nada voltou a ser igual, embora chegassem tempos de semelhança quando novas faces brilhantes, de olhos ávidos, devoravam, impacientes, as luzes que brilhavam e dedos teimosos esburacavam os papéis em tentativas de descoberta.
Mas parece que tudo se foi...Hoje, ressaltam risos, tristezas, gargalhadas e lágrimas solitárias, numa amálgama de emoções contraditórias que não permitem a felicidade plena.
...o "Dar" fica amarrotado e sai desafinado, como uma viola velha e maltratada pela humidade dos tempos, assemelhando-se ao mero cumprimento formalizado daquela obrigação a que não podemos fugir. As presenças são marcadas pela obrigação ou por não existir opção. Sentem-se no ar revoltas e amarguras ...e os estragos na alma que se exige "perfeita" começam a ser irreparáveis...
E quando apenas se quer paz e harmonia, o coração parte-se...
Uns pedaços, chorando, acompanham quem, na distância, sempre se mantém presente mesmo quando, querendo sem querer, segue noutra viagem ...outros ficam, quebrados, doridos e cansados, querendo apenas o aconchego quente e repousante do silêncio, o alumiar suave da pequena vela que simboliza uma enorme luz que brilha, sempre crescendo, no coração...
Enfim, a vida é assim mesmo! Restam as velhas lembranças de belos momentos outrora vividos, e, as saudades de ser novamente criança...
ResponderEliminarGostei deste espaço e das memórias que este post me relembrou.
Abraço,
CR/de